Aos poucos imagens de sua vida se formavam, muitas coisas que não se lembrava quando vivo, os braços acolhedores da mãe em seu primeiro contato pós nascimento, a agradável voz do pai que o confortava, o quarto sem luxo mas com muito carinho.
Aspectos desconhecidos de sua vida se tornavam claros e ele agora a assistia com uma mente não limitada pela parca capacidade humana, as pessoas ao seu redor tinham dimensões e motivações que facilitavam o entendimento de suas atitudes, não se resumiam a boas ou más pessoas.
Ele revivia importantes momentos de sua existência e aprendia ainda mais com eles, como se em vida tivesse experimentado apenas a ponta de um iceberg, passou a ser capaz de extrair o máximo de situações tidas como irrelevantes.
Sentiu a alegria da infância e o inocente pesar de seus amores não correspondidos de adolescência, descobertas e sonhos ainda não minados pelo peso da vida adulta que se mostrou um fardo repleto de convenções sociais, frases prontas, datas para guardar e compromissos inadiáveis mas sem importância real.
Aquela retrospectiva lhe mostrou muitas de suas escolhas, tentativas de fuga da pressão dos dias que considerava pesados mesmo ainda sendo jovem e este talvez fosse o problema, ainda não estava preparado para o que viria, e as escolhas erradas o conduziram à depressão, era como choro do recém nascido que sai de um mundo de segurança para o desconhecido, mas não podia abrir a boca ao mundo, não é o que se espera de um adulto.
Não era o final que definiria sua história, o trajeto fora escolhido anos atrás e as diversas rotas de fuga de um triste destino ignoradas.
Não foi a vida a responsável, não foram os maus amigos, não foram as cobranças…Ele agora sabia, não…realmente não, não era o dedo que puxara o gatilho o responsável por seu fim, eram suas escolhas e todo o caminho que trilhara.
E foi quando compreendeu isso que lembrou de ter comprado a arma…